
A Comissão de Cidadania e Direitos Humanos (CCDH) ouviu nesta quarta-feira (15/10) o depoimento do policial penal Samuel Ferreira Machado. Lotado na 5ª Delegacia Penitenciária Regional, ele participou de reunião com o colegiado e apresentou denúncias de assédio moral no trabalho, que envolvem proibição de alimentação e acesso à água e banheiro. Conforme Machado, os problemas se acentuaram a partir de maio do ano passado, quando o delegado Fábio Rosa dos Santos assumiu a penitenciária.
Convidado pelo deputado Jeferson Fernandes, Machado afirmou que os casos de assédio tiveram início após um policial penal chegar atrasado ao trabalho. “Ele (Fábio) determinou que os colegas pagassem flexões e exercícios em ato de sadismo. Ordenou que os mesmos ficassem agradecendo ao colega que chegou atrasado pelos castigos físicos que estavam sofrendo. Essas ocorrências foram encaminhadas à Corregedoria-Geral do Sistema Penitenciário, que arquivou o caso contra os gestores e indiciou o denunciante”, destacou.
Após essa punição, Machado e a esposa do denunciante passaram a sofrer perseguições. “Depois de certo tempo, o delegado começou a proibir explicitamente o consumo de alimentos por parte dos operadores, assim como chegou ao ponto de restrição de consumo de água, trancando a cozinha da penitenciária de Camaquã, que os colegas não tiveram acesso nem à água potável. Escutei o relato de um colega que disse ter tomado água do banheiro do presídio, porque estavam com sede pela questão da extensão da operação”, assinalou.

Conforme Machado, uma colega também pediu exoneração do cargo após os frequentes casos de assédio moral. Ela assumiu o cargo em abril de 2024, mas em novembro do mesmo ano pediu licença. Em março deste ano, a policial penal pediu demissão do cargo. “Não tinha absolutamente nada para fazer, as minhas mensagens não eram respondidas, as atividades que eu tentava fazer, que dependia de ajuda de outro servidor, não tinham resposta. Fiquei realmente isolada, sem função nenhuma. Acabei ficando psicologicamente afetada, entrei de licença”, relatou, em áudio enviado à Comissão.
Machado salientou os problemas enfrentados a partir da gestão do delegado Fábio e do coordenador Rafael Koperec. “Isso começou a se escalonar de uma forma que foi começado a proibir-se alimentar e chegou ao ponto de os servidores não poderem fazer o consumo de água, pois o delegado começou até a fazer chacotas dizendo que operações não eram café colonial, que não era para comer”, completou. Por conta desses problemas, Machado está afastado das funções e faz tratamento psiquiátrico.
O deputado Jeferson Fernandes afirmou que Machado é um policial penal qualificado e habituado ao exercício da função, mas salientou que as denúncias de humilhação por superiores são recorrentes, principalmente em Pelotas. Relator do Projeto de Lei que regulamenta a Polícia Penal no Estado em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Jeferson afirmou que o Projeto de Lei determina que a Polícia Penal é calcada na hierarquia e disciplina, o que só tem escora jurídica nas Polícias Militares.
“Então, na prática, essa gestão está querendo colocar no texto da lei o que vem executando na prática, que é impedir o policial penal de questionar, de ter direito, inclusive, a habeas corpus. O policial militar já se encontra sufocado por esse tipo de previsão legal, que inclusive é questionada também para os militares, os abusos que os praças sofrem. Então não podemos tolerar que isso aconteça na polícia penal”, assegurou. A CCDH decidiu encaminhar as denúncias ao governador Eduardo Leite, ao chefe da Casa Civil, Arthur Lemos, e à a Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo.
Ao mesmo tempo, Jeferson explicou que as denúncias devem ser encaminhadas ainda ao Ministério Público do Trabalho (MPT) e ao Ministério Público Estadual (MP). “O Ministério Público Estadual tem o papel de fiscalizar as polícias, no que diz respeito à improbidade, abuso de poder e crimes. Entendo eu que tem todos esses elementos dentro dessa narrativa feita aqui. Então, o Ministério Público Estadual também e pra ter um apoio institucional aqui também à própria Defensoria Pública Estadual”, destacou.
Para a deputada Sofia Cavedon, o assédio aos policiais penais é inaceitável. “É um trabalho penoso, um trabalho tenso, um trabalho de risco, de tensão, de corda esticada o tempo inteiro. Não é possível que as chefias os desumanizem desse jeito. O que enxergo é uma desumanização, uma prática de assédio e uma prática de violência revoltante”, frisou. Ela afirmou que o governo tem que ser informado sobre as denúncias. “Não consigo imaginar que ainda no século XXI essas relações de trabalho existam no serviço público”, completou.
A deputada Laura Sito, que conduziu os trabalhos na Comissão, prestou solidariedade ao policial penal e afirmou que os relatos colhidos na Assembleia revelam a gravidade da situação enfrentada pelos funcionários públicos. “Demonstram que o assédio moral se tornou um método de organização da categoria por parte do ambiente diretivo”, assinalou.
Texto: Felipe Samuel
Foto: Greice Nichele